As atividades realizadas no CDC Tide Setubal e no Galpão de Cultura e Cidadania proporcionam experimentações que contribuem para que crianças, adolescentes e jovens ampliem suas possibilidades de aprendizagem, conheçam o seu lugar e se reconheçam nele, com um sentido de pertencimento, criem vínculos entre si, exercitem a convivência e a participação. Esses caminhos começam a ser traçados dentro desses espaços, mas ganham sentido mais amplo para o desenvolvimento humano e social na circulação, que proporciona um encontro com a cidade.
A sua ocupação e apropriação, ou seja, o direito à cidade, precisam ser trabalhadas e garantidas como meio para diminuir as desigualdades de oportunidades. A partir de um alinhamento com a proposta pedagógica, de uma sensibilização inicial sobre o tema e local a ser visitado, e com espaços para devolutivas e compartilhamentos, os passeios com os participantes dos projetos foram agrupados em quatro eixos: culturas negras; fruição do espaço público; arte, cultura e cidadania; e espaços formativos.
O eixo culturas negras propõe discussões e vivências relacionadas às manifestações culturais que dialoguem com a cultura africana e afro-brasileira. A ideia é desnaturalizar e superar paradigmas sociopolíticos e culturais que reforçam a desigualdade racial e contribuem com a violação de direitos humanos. Estimular a reflexão e a problematização de diferentes questões é fundamental para o empoderamento e o posicionamento crítico.
Os primeiros passos dessa trilha foram dados pelo bairro com a participação no Encontro de Cultura Hip Hop. As crianças e os adolescentes integraram a programação do evento com a grafitagem coletiva em um dos muros escolhidos para a atividade. O grupo desenhou uma árvore composta com os nomes de todos os presentes, tendo no centro o nome do Galpão de Cultura e Cidadania como símbolo da amizade e da força da coletividade. Os educandos das oficinas de artes plásticas participaram da criação de quatro painéis grafitados, orientados por grafiteiros da região de São Miguel. O material foi exposto no Sarau da Cozinha, promovido pelo coletivo Marginaliaria.
O Museu Afro Brasil foi a segunda parada do grupo e trouxe uma experiência diferente para os visitantes. Antes de conhecer o museu, os educandos fizeram uma roda de capoeira na entrada do espaço. A ideia proporcionou um momento de integração com os usuários do Parque do Ibirapuera, que fotografaram, cantaram e participaram da roda. Foi possível identificar a satisfação dos alunos ao se perceberem como protagonistas de uma ação cultural fora do bairro onde moram. Na sequência, participaram de uma visita monitorada e conheceram o acervo, que abarca temas como religião, trabalho, arte, registros históricos e as influências africanas na construção da sociedade brasileira. No final da visita, o grupo participou do Sarau São Paulo em Verso e Prosa: vozes afro-brasileiras, onde recitaram poesias, escreveram letras de músicas e, no encerramento, participaram de uma grande roda de dança e canto afro.
Dois batizados de capoeira também entraram na rota dos passeios do ano. Um deles aconteceu no CEU Pimentas, em Guarulhos, e outro no Grupo Coquinho Baiano, em São Sebastião, onde, além de participarem do evento de batismo, puderam também ir à praia. É possível perceber o impacto forte entre os jovens capoeiristas quando participam desses momentos de intercâmbio. Conhecer e compartilhar conhecimentos com outros mestres e alunos ajuda na criação de suas identidades e no sentimento de pertencimento ao grupo e auxilia na possibilidade de despertar esse sentimento fora dele.
Conhecer diferentes pontos da cidade, acessando seus espaços de forma qualificada, circulando pelas vias públicas e se colocando em contato com diferentes grupos é uma das ações do eixo fruição do espaço público. A Avenida Paulista é o cenário de um desses passeios. Durante um dia, crianças, adolescentes e jovens conheceram o Masp, a Fiesp, o Parque Trianon, o Itaú Cultural, a Casa das Rosas e terminaram com uma sessão de cinema no Shopping Paulista. Essa imersão traz para os educandos descobertas de novas possibilidades da cidade onde moram.
Entre os jovens do Intermídia Cidadã, uma visita ao Centro Histórico de São Paulo foi o ponto de partida para a terceira fase do projeto, que contou com a integração de cinco novos participantes ao grupo. Estação e Parque da Luz, Viaduto Santa Ifigênia, Pateo do Colégio, Largo e Mosteiro de São Bento foram fonte de pesquisa e visitação. Após circular pelo centro da cidade, o grupo foi recebido na Secretaria Municipal de Desenvolvimento Urbano para conhecer os projetos para a cidade e abordar as demandas de São Miguel, tema de trabalho do projeto.
Ainda no centro da cidade, crianças, adolescentes e jovens de diferentes projetos e oficinas visitaram a Sala São Paulo. O grupo ficou encantado com a história de transformação de uma estação de trem em um espaço com a atmosfera teatral. A experiência musical também foi uma novidade, que sensibilizou os educandos, atentos e envolvidos com a apresentação o tempo todo.
E se visitar e desvendar a cidade onde moram já traz novas visões e muitas descobertas, imagine viajar. Os integrantes do projeto Toque de Letras, que une comunicação, cidadania e esporte (leia mais aqui) foram a Santos para visitar o Museu Pelé, o Memorial das Conquistas do Santos e a praia. A história do time da baixada santista e do rei do futebol, revelando suas trajetórias e conquistas, animou o grupo de boleiros. Em 2014, eles também tiveram a oportunidade de visitar a Taça da Copa do Mundo e a ansiedade tomou conta dos jovens atletas até o momento de chegar perto desse objeto de desejo de quem disputa um mundial de futebol. Além de ver a peça cobiçada, os alunos assistiram a clipes de diferentes Copas ao redor do mundo e participaram de jogos interativos. Emoção ainda maior viveram os Renato Alves da Silva e Caike de Oliveira Assim que foram sorteados para a assistir um dos jogos da Copa, no Itaquerão.
A experimentação em múltiplas linguagens artísticas e expressões culturais que contribuem com o desenvolvimento é o princípio do eixo arte, cultura e cidadania. Ressaltar a importância do brincar e das brincadeiras de crianças e entre pais e filhos é a motivação para as comemorações da Semana Mundial do Brincar e um dos passeios realizados. Durante uma tarde, as crianças dos projetos, e alguns pais que foram ao passeio, puderam participar de brincadeiras e se envolver em oficinas voltadas ao resgate cultural das brincadeiras de rua e vivências lúdicas, com pernas de pau, cabaninhas, cordas. No final do passeio, o grupo assistiu ao espetáculo Rádio Show sobre os antigos programas de rádio, realizados em auditórios.
A história do Brasil também foi tema do espetáculo A Cobra Vai Fumar, do grupo Teatro Popular União e Olho Vivo, coletivo que há 46 anos investe em uma arte de resistência. Na apresentação, relatos de ex-pracinhas sobre a Segunda Guerra em uma crítica aos governos totalitários do passado e do presente. Vale destacar a presença dos jovens do módulo de Teatro para Iniciantes, que, posteriormente, apresentou a peça O Sonho de Sophia, escrita por eles, com personagens que viveram o período militar.
Ainda nos palcos, os alunos da Dança e outros integrantes de diferentes oficinas foram assistir ao espetáculo Ágape, com trechos de importantes coreografias da Raça Companhia de Dança. A apresentação com diferentes movimentos prendeu a atenção do grupo, pois proporcionou a descoberta de outra realidade cultural com muitas formas, cores e sons.
Outra experiência que apresentou um mundo aos seus visitantes foi a exposição Os Mayas – revelação de um tempo sem fim. O estilo de vida, a organização sociopolítica, a religiosidade e os valores estavam presentes em diferentes objetos que carregam as marcas dessa história. As crianças voltaram para casa muito empolgadas para compartilhar o que tinham visto e aprendido sobre o calendário maia, o futebol e outras tantas curiosidades.
Integrar a saída para outros lugares e novas experiências a um processo de estudos e formações é o objetivo do eixo espaços formativos. Em 2014, duas iniciativas seguiram esse alinhamento. É interessante observar que as duas ações foram selecionadas pelos próprios jovens, o que, em certa medida, revela a influência das outras experiências de circulação e vivência.
A partir da proposta de criar um projeto para adolescentes grávidas e para jovens mães, em parceria com a Unidade Básica de Saúde do Jardim Lapenna, duas participantes do Intermídia Cidadã se propuseram a sair de São Miguel para participarem do Fórum sobre Gravidez na Adolescência e a Exploração Sexual contra Crianças e Adolescentes, promovido pelo Instituto Sedes Sapientiae na zona oeste da cidade. A ideia era fortalecer suas iniciativas e prospectar materiais de estudo no desenvolvimento do projeto de intervenção local.
As devolutivas da experiência de participação foram repletas de análises e contrapontos, o que reforçou o desejo de implantar um projeto acolhedor e sem julgamentos morais na comunidade. Outra iniciativa foi a participação de um dos jovens do Intermídia Cidadã no Festival RIA, promovido pela Fundação Telefônica. O encontro discutiu educação, arte, tecnologia, juventude, participação social e desenvolvimento humano com a presença de especialista. As informações foram multiplicadas no grupo para fortalecer as estratégias de comunicação comunitária.